terça-feira, 7 de abril de 2009

O Homem e o Processo de Socialização

Basta nascermos para nos tornarmos humanos? Pergunta estranha, é verdade, mas faz sentido, uma vez que a história registra casos de seres humanos que, apesar de fisicamente iguais a nós, não eram exatamente humanos, no sentido mais estrito do termo. Veja dois desses casos: “Ramu, o “menino lobo”, foi um garoto criado por uma alcatéia e encontrado por pessoas quando tinha 10 anos de idade. Criado por lobos, não teve contato com seres humanos até o momento em que foi encontrado. Não tomava banho, não se vestia, andava de quatro e se alimentava de carne crua, como os lobos com quem foi criado. Jamais aprendeu a falar e nuca deus sinais de querer se integrar socialmente.” “Amala e Kamala era duas meninas que foram descobertas em 1921 numa caverna da Índia, vivendo entro lobos. Tinham, respectivamente, mais ou menos 4 e 8 anos de idade quando foram encontradas. Ambas apresentavam hábitos alimentares bastante diferentes dos nossos. Como fazem normalmente os animais, elas cheiravam a comida antes de tocá-la, dilacerando o alimento com os dentes e poucas vezes fazendo uso das mãos para beber e comer. Possuíam aguda sensibilidade auditiva e desenvolvimento do olfato para a carne. Locomoviam-se usando as mãos e os pés, de modo quadrúpede, como os lobos. Kamala demorou seis anos para aprender a andar sobre duas pernas, isto é, de modo bípede e ereto.” Os casos citados acima são duas das mais famosas ocorrências de isolamento social de seres humanos. Diante desses casos verídicos, a lenda de que Remo e Rômulo, supostos fundadores de Roma, foram criados por uma loba não é tão absurda assim. Mas seres que agem assim, como outros animais, não são considerados exatamente humanos. Aristóteles disse que “o homem é um animal social”. Com isso, queria dizer que sem a sociedade não há humanidade, isto é, o homem necessita do contato social para tornar-se humano. É em sociedade que desenvolvemos capacidade que julgamos simples tais como nos comunicar através da fala, andar de modo ereto, escrever, ler, compreender símbolos, ter fé religiosa, fazer planos etc. Se nascemos e crescemos isolados, nada disso se desenvolve em nós. Como os casos de isolamento citados apontam, o ser humano tende a adquirir as características do grupo no qual cresce e interage. Se nasce e cresce entre lobos, de alguma forma, será um lobo também. Tal fato nos lembra o filósofo inglês John Locke, para quem “o homem é uma tábula rasa”, ou seja, uma folha em branco na qual tudo pode ser escrito. Se é assim, perguntará o leitor, o homem é mero produto de sua sociedade? Não. Ele adquire os hábitos, os valores, as crenças e tradições do grupo em que vive, mas, pelo menos em sociedades complexas como a nossa, ele possui significativo grau de liberdade em relação a tais modos de pensar e agir, podendo até contribuir para a mudança cultural de sua sociedade. Em outras palavras, o homem é produto e produtor da sociedade e da cultura. Por exemplo: você nasceu num país em que a corrupção é bastante tolerada e praticada. Diante de tal situação, você pode praticar a corrupção no seu dia-a-dia ou, refletindo sobre suas conseqüências para você e os demais cidadãos, agir de modo ético em sua vida diária e trabalhar no combate à corrupção. Todo aprendizado, toda inculcação de crenças, todo comportamento humano, nasce no processo de socialização. Socialização é o longo aprendizado que começa quando nascemos e só acaba com a morte. É por meio dele que nos tornamos humanos e membros de nossa sociedade, isto é, compartilhamos crenças, um idioma, maneiras de pensar, agir e ver o mundo que nos cerca. Ramu, Amala e Kamala, não foram socializados entre nós, assim não se tornaram humanos. A socialização (se é que podemos assemelhar a aprendizagem entre os animais não-humanos à aprendizagem que se dá entre humanos que se relacionam) pela qual eles passaram foi entre lobos, o que os fez lobos também. (Por enquanto é só)

Nenhum comentário:

Postar um comentário